Xingu vivo! Não a Belo Monte

Por Mauricio Santos Matos

A audiência pública sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte, ocorrida em Belém no último dia 15/setembro, foi uma bela demonstração de como excluir o povo das decisões. Não foi sem razão que os manifestantes contrários ao projeto do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte – AHE Belo Monte gritavam: “se ela é pública / assim não dá / tem que deixar o povo entrar”.

A luta contra a construção de barragens na bacia do rio Xingu ganhou força a partir de 1989, quando foi realizado o 1º Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em Altamira, Pará. A vitória daquela jornada fez com que os governos Sarney e Collor engavetassem o assunto, hoje ressuscitado pelo governo Lula.

A proposta mudou: ao invés das cinco hidrelétricas previstas, o Conselho Nacional de Política Energética, em julho/2008, definiu que somente Belo Monte seria construída. O projeto orienta a instalação de uma barragem para desviar o curso do rio e formar um grande reservatório, inundando uma área de 516 km². Esse grande lago, que colocará no fundo as margens do rio Xingu – onde moram cerca de 20 mil pessoas – e áreas de terra firme, com florestas e sítios arqueológicos, acionará as turbinas da hidrelétrica.

Para tentar impedir mais um crime ambiental na Amazônia, a partir das 16h, em uma rua lateral ao complexo da Fundação Cultural Tancredo Neves – CENTUR, índios Tembé, sindicalistas, militantes de ONGs, sem-terra e estudantes, iniciaram o ato público contra a construção da hidrelétrica de “Belo Monstro”, rebatizada pelo movimento.

A audiência não-tão-pública em Belém foi marcada por vários fatos que demonstram a disposição dos governos estadual e federal em utilizar os métodos de repressão da ditadura militar, como há 20 anos, para tentarem impor as hidrelétricas. A manobra inicial foi trocar o local da reunião. Marcada para o Auditório Ismael Nery, com capacidade de somente 750 lugares, foi transferida para o Teatro Margarida Schivasappa, no mesmo centro de convenções (CENTUR), mas que comporta apenas 500 pessoas sentadas.

Para intimidar, reprimir e conter o povo, a organização do evento chamou os militares da Força Nacional. Inicialmente tentaram impedir o acesso dos manifestantes ao CENTUR. Como não conseguiram, foi feita uma barreira, com 20 policiais, para impedir o acesso ao Teatro onde se realizaria a audiência.

E mesmo após a negociação feita para permitir a entrada de todos, oito membros da tropa ficaram perfilados à frente da mesa que dirigiria a audiência, voltados para o público, numa clara atitude intimidatória. Tais fatos, dentre outros, levaram os representantes do Ministério Público Federal e Estadual a se retirarem da mesa.

De imediato todos que estavam contra o AHE Belo Monte também se retiraram do local. Assim, a audiência não-tão-pública continuou. Mas sem as vozes críticas. E sem os militares, que saíram da frente do palco, armado para que os falsos atores pudessem continuar sua encenação, contando com os aplausos encomendados. Visto por este ângulo, a realização da audiência em um teatro, foi um irônico acerto.

Mas as manifestações ainda não haviam terminado. Fora do teatro, em meio a entrevistas coletivas e palavras-de-ordem, foi lançada a proposta de um derradeiro ato: o fechamento da rua em frente ao CENTUR. Já passavam das oito da noite, mais de quatro horas após o início dos protestos, e lá fomos nós, com faixas, bandeiras e cartazes, denunciar mais uma vez : “Hidrelétrica de Belo Monte: progre$$o e bem estar para os grandes empresários; sufoco para os povos da floresta”.

Dias depois, em 22/setembro, Procuradores da República anunciaram à imprensa que a Justiça Federal de Altamira receberá uma ação civil pública pedindo a anulação das quatro reuniões ocorridas e a realização de uma nova rodada de audiências, em todos os 11 municípios que se situam na Área de Influência Indireta (AII) da AHE Belo Monte.

Em entrevista coletiva, denunciaram que os representantes do Ministério Público foram impedidos de participar das mesas diretoras nas audiências públicas nos municípios de Brasil Novo, Vitória do Xingu e Altamira.

Apesar das ações institucionais serem de grande importância, tem ficado claro que a construção de barragens no Xingu é uma opção política, que visa beneficiar empreiteiras e mineradoras. Assim, para conquistarmos novas vitórias, será necessária a manutenção da aliança entre socialistas, ambientalistas, indígenas, moradores, sindicalistas, estudantes e sem-terra. Só o povo mobilizado garantirá que o Xingu permaneça vivo. Fonte: Subversivas Palavras


Belém, 26 de setembro de 2009



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