A Água e os Refugiados Ambientais - Parte I

Telma Delgado Monteiro

O economista americano Lester R. Brown é autor do livro Eco-Economia - Uma Nova Economia para a Terra, onde afirma que o planeta deverá passar por um “choque ecológico” para se adequar a uma economia ambientalmente sustentável. Será preciso nivelar e compatibilizar a relação entre a economia e os ecossistemas, sob pena de se atingir um estado de emergência ecológica.  
Brown analisa o planeta sob a ótica da eco-economia e enfatiza  a necessidade de respeito aos princípios da ecologia, a necessidade de uma conscientização ecológica e a urgência  de se criar um mundo sustentável onde  economistas e ecólogos firmem um compromisso que envolva  matérias transdisciplinares.
Para que se tenha uma idéia da importância de Lester Brown, e a propósito de sua viagem ao Brasil em que participou do Fórum Internacional de Energia Renovável e Sustentabilidade – EcoPower Conference 2008, em Florianópolis, reedito um resumo de seu livro que pode ajudar a pensar o Brasil que queremos. Esta é a primeira parte de três que publicarei.
A Economia Global

Com aqüíferos exauridos criou-se um déficit hídrico. As florestas estão encolhendo 9 milhões de hectares ao ano, explica. “Extinção é para sempre”, diz ele, e exemplifica citando os impactos no clima, a interferência na manta de gelo da Groenlândia que, condenada ao derretimento, poderá elevar o nível do mar em 7 metros.

Interessantes são os fatos históricos que ele relata sobre a extinção de algumas civilizações. Os Sumérios, em 250 AC, criaram  uma falha ambiental ao utilizar a água na agricultura de forma insustentável, que resultou na  salinização do solo; os habitantes da Ilha de Páscoa, pescadores exemplares, consumiram toda a madeira da ilha para fazer as embarcações pesqueiras e  morreram de fome quando faltou madeira; os Maias pereceram de fome, quando a produção agrícola em áreas  terraceadas  ficou  inviável devido à erosão do solo. 

Hoje o planeta tem mais de 80 milhões de refugiados ambientais fruto da dilapidação do capital natural da Terra. Os déficits ecológicos criados serão pagos pelas gerações futuras. Lester Brown conclama para um planejamento da economia que respeite os fundamentos da ecologia e convida o mercado a falar a verdade ecológica.

Brown sugere que se crie um “imposto ambiental” e que se divulgue o real custo total dos produtos e serviços que compramos, incluindo o custo ambiental efetivo.

A Relação Estressada

Os sinais de estresse estão muito claros e evidenciam, principalmente, a escassez da água. O degelo, diz ele, vem se agravando e trará a elevação do nível do mar, com a perda substancial de áreas litorâneas. Essa retração equivaleria a reduzir o território dos EUA em 36 000 quilômetros quadrados. 

O resultado disso será o aumento - em milhões - do número de refugiados climáticos em regiões como Bangladesh, China, Índia, Indonésia, Filipinas e Vietnã. 
É preciso pensar, continua ele, que num futuro muito próximo serão os refugiados climáticos que dominarão o fluxo internacional de migrantes. Qual é o custo de assentar essas pessoas?  O custo das catástrofes, que em 1960 era de US$ 69 bilhões, em 1990 passou dos US$ 536 bilhões.   Apropriadamente, Brown cita exemplos como o Mar de Aral que recuou 12 metros desde 1960, perdendo 40% da área e 66% do volume. O rio Amu Darya, que nele desaguava,  já está praticamente seco e o Mar de Aral secará  em uma ou duas décadas.

Ele usa outros exemplos como o Rio Amarelo, na China, que em 1977 chegou a ficar 226 dias sem chegar ao mar; o Rio Nilo, que banha três nações e pode morrer por falta de um projeto de estabilização das populações ao longo do seu curso; o Rio Jordão que deságua no Mar da Galiléia e cujo nível vem decrescendo espantosamente; e o Mar Morto, que está encolhendo.

Lester Brown se estende na análise assustadora da planície norte da China onde o nível do lençol freático está se reduzindo à base de 1,5m ao ano. China, Índia, Arábia Saudita, África do Norte e EUA estão exaurindo seus aqüíferos à ordem de 160 bilhões de metros cúbicos por ano. Ele faz uma equação muito interessante para ilustrar sua análise: cada tonelada de grãos equivale a 1 000 toneladas de água. 

Quando os países perdem sua capacidade de irrigação acabam aumentando sua necessidade de importação de grãos. A água para suprir a demanda das cidades tende a migrar da água que seria usada na irrigação e fará falta na produção de grãos. Importar grãos é, na equação de Brown, importar água numa proporção de 1000 toneladas de água para cada tonelada de grãos. Incrível!

A competição pela água se refletirá nos mercados futuros de grãos, enfatiza. Dai pode-se facilmente concluir que se o governo do Brasil planeja aumentar exponencialmente a produção de grãos para suprir a demanda externa, avançando sobre a floresta, vai, na realidade, exportar água – em volume mil vezes maior e sem o cálculo do custo real para as atuais e as futuras gerações.

O México já contribui com 1 036 quilômetros quadrados ao ano de terras abandonadas, exauridas e desertificadas; a África em 2025 terá mais de 2 bilhões de pessoas. Daí pode-se presumir a escalada do número de refugiados ambientais. Alerta Lester Brown, também, para o possível estágio inicial da sexta grande extinção da Terra, que não se dará por fenômenos naturais. 

Neste ponto ele cita Chris Bright “A natureza não tem botão de reiniciar”. Devemos separar a economia da ecologia? 

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